quarta-feira, janeiro 03, 2007

Uma democracia pousada nos escombros de uma sucessão dinástica de séculos.

Ngungunhana ,imperador
do imperio de Gaza,
em Mocambique
Tem sido uma questão que provoca inquietações, dúvidas, clivagens políticas e até mesmo étnicas quando se pretende saber qual é a dinastia que lidera verdadeiramente na cena política moçambicana.
Mas, como muitos bem sabem, os pedaços da nossa história se vão revelando na medida em que os dias correm.

Eis, então, que numa leitura ao semanário SAVANA do dia 22 de Dezembro de 2006, nos aparece um excerto cuidadosamente transcrito por António Cabrita, retirado do livro “ Quase memórias” da autoria do Dr. Almeida Santos, antigo advogado em Moçambique, responsável pelos assuntos de descolonização nos governos de Portugal a seguir ao 25 de Abril e ex- Presidente da Assembleia da República Portuguesa.
O excerto, refere-se ao nível de relacionamento entre o Presidente Samora Machel e o Dr. Almeida Santos, a influência deste último para ao Acordo de Nkomati e a visita histórica do Presidente Machel à Portugal.

Mas algo mais de fundo aparece no excerto, que desperta atenção a qualquer moçambicano, pois, se refere a uma expontânea conversa tida entre o Presidente Samora Machel e o Dr. Almeida Santos durante um jantar no relvado do jardim do palácio da presidência. Nesta conversa, que passamos a transcrever, perguntou o Presidente Samora Machel ao Dr. Almeida Santos nestes termos:
“- Tú sabes, Almeida quem me vai suceder?
Respondi-lhe, sendo jovem, a questão não se punha!
- Põe-se sempre – disse.
Fugi a responder, dizendo-lhe que não fazia a menor ideia.
- É o Chissano! – disse perante a estupefacção de todos os presentes. O que queria dizer aquilo?
- Um bom político, com experiência... – balbuciei eu, sentindo-me na necessidade de acrescentar alguma coisa.
- Não é nada disso – corrigiu Machel.
- Vocês europeus não percebem nada de política africana!
E com surpresa minha acrescentou:
- Ele vai suceder-me porque descende de reis. E em África, o poder é, por tradição monárquico!”*

Na verdade, após a morte de Machel, Chissano tornou-se o 2° presidente da República Popular de Moçambique. Como e porquê? Não se sabe bem.
É deste modo como a linha de sucessão dos Presidentes da República e até mesmo de lugares políticos de peso se tem operado em Moçambique. Na verdade, a ideia de sucessão dinástica não estava só em Samora Machel, mas ela continua enraizada nas mentes de toda um linha de descendentes de Ngungunhana, Godide, Molungo, Zixaxa e outros. Sem dúvida nas mentes dos sulistas.

Mesmo assim, até certa altura, alguns cidadãos, de mediana consciência, aperceberam-se do beco sem saída em que se iam metendo e começaram a fazer apelos para uma mudança de situação. Com isso nada mudou. Primariamente se apercebeu o grande partido e procurou mais uma manobra dilatória. Assim, para concorrer para Presidência é escolhido o cidadão Armando Emílio Guebuza. Dados biográficos mostram que ele nasceu em Nampula (Norte de Moçambique), mas pouco se fala da origem dos seus ascendentes. É que na realidade, no pensamento comum, um filho nascido em Nampula porque pais que vinham em missão de serviço provenientes do Sul, é do Sul.

E o humilde povo votou ciente de que mudava a situação da sucessão dinástica sulista. Mas foi simplesmente enganado. O povo esqueceu-se de perguntar de onde é que era o actual Presidente da República de Moçambique.
E de certo espera-se uma outra partida para as eleições de 2014, porque as de 2009 já estão ganhas.

Bem analisados os factos, o Presidente Samora Machel tinha toda a razão. É isso mesmo que tem acontecido em alguns países africanos, mesmo sob os auspícios das democracias ocidentais. E para não citar tantos exemplos, podemos somente mencionar os casos do Togo, a sucessão de Nyassimbe Eyadema; o caso do Congo, a subida de Joseph Kabila ao trono; os casos frequentes da Suazilândia.

Na verdade, para além da designação constitucional dos órgãos de soberania , que é uma designação meramente formal, a sucessão dinástica é uma realidade. É um facto político de peso em Moçambique e em África.

Pode parecer que com o texto pretendamos criar situações de divisionismo. Mas, em abono da verdade, pesem razões em contrário, a questão étnica e regional é um factor político de grande relevância. Aliás é por causa de um apelo desta natureza que o actual Presidente da República Moçambicana ganhou as eleições de 2004, com uma esmagadora maioria, alienando as mentes inocentes do norte e centro do país.

Ficam desde já, alguns pontos de análise e a ideia chave de que em Moçambique só pode ser Presidente da República quem descende de reis sulistas. Ao menos que uma parte do povo moçambicano ganhe a consciência disso e reverta a situação.

* António Cabrita, Samora Machel, Nkomati e Almeida Santos, in SAVANA, de 22 de Dezembro de 2006, Ano XII, N° 676, pág 12.

3 comentários:

Carlos Serra disse...

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Carlos Serra disse...

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Carlos Serra disse...

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