sexta-feira, dezembro 22, 2006

Que tipo de democracia se pretende construir em Moçambique?


Um dos pontos de agenda para os dias 20 e 21 de Dezembro de 2006 na Assembleia da República moçambicana era de a discussão e aprovação da lei eleitoral.
Acontece que durante a discussão houve divergências entre as duas bancadas quanto à manutenção ou a eliminação da barreira dos 5% para a eleição dos deputados para a Assembleia da República. A FRELIMO defendia a eliminação da barreira e RENAMO- UE era pela manutenção.

Mas constituindo a FRELIMO bancada maioritária, esta obteve uma votação favorável ao projecto de lei pela eliminação da barreira. Do outro lado a RENAMO – UE, achando não ter havido consenso na aprovação da lei, abandonou a sala de sessões da Assembleia da República. Enquanto isto acontecia, a FRELIMO aprovava a lei eleitoral.

No dia 21 de Dezembro, prestes ao término da sessão, os deputados da RENAMO – UE de novo abandonaram a sala de sessões da Assembleia da República deixando a FRELIMO sozinha no parlamento.

Longe de considerações de outro género, a RENAMO – UE teve e tem razões de fundo para abandonar a sala de sessões da Assembleia da República. Mas tais razões seriam política e praticamente eficientes se tivessem uma base constitucional ou legal.
Em boa verdade, nalguns países uma lei eleitoral é aprovada por uma maioria qualificada e tem sido uma lei de valor reforçado. Em Moçambique isto não acontece. Uma lei eleitoral pode ser aprovada por uma maioria simples e não há nenhum impedimento constitucional ou legal para tal. Então, eis o resultado o que aconteceu nos dias 20 e 21 nas sessões da Assembleia da República.

Neste contexto, há uma questão de fundo que passa por haver em Moçambique uma lei, que entende ser de revisão constitucional, que estabeleça regras de aprovação de certas categorias de leis. No nosso entender, as leis eleitorais para os órgãos de soberania e provinciais, leis orgânicas dos órgãos de soberania, deveriam ser aprovadas por uma maioria qualificada dos deputados como acontece nos outros países. Só assim a razão da RENAMO – UE seria operante. Não necessitaria, portanto, esta coligação política de tocar apitos no parlamento, pois teria um instrumento legal par requerer a declaração de inconstitucionalidade de uma lei de tal categoria aprovada por uma maioria simples.

Ainda quanto à barreira dos 5%, estabelece primariamente em epígrafe ao artigo 3° da Constituição da República de Moçambique que a República de Moçambique é um Estado de Direito Democrático. Isto significa, claramente, que para alem de ser um Estado de Direito, a ordem de domínio deve ser legitimada pelo povo. Deve haver uma organização política democrática.
Neste sentido, a Assembleia da República tem sido um dos mais básicos espelhos reveladores de uma organização política democrática. Mas que tipo de democracia se trata? Indubitavelmente, é uma democracia representativa.

Sendo assim, a eliminação da barreira dos 5% é mais favorável para uma democracia representativa, no sentido de que o parlamento deve ser um mapa reduzido do povo. Nele devem estar representados, quanto possível, todos os grupos sociais e partidos políticos. A manutenção da barreira ofuscaria os pequenos partidos e assim haveria o risco de haver um sistema bipartidário e sempre tendendo a balança para o partido maioritário.Nesta mesma linha, se pode tirar algumas ilações do n° 2 do artigo 135° da Constituição da República de Moçambique ao estabelecer que o apuramento dos resultados das eleições obedece ao sistema de representação proporcional. Portanto não haveria representação proporcional se se mantivesse a barreira dos 5%, tendo ainda de se acrescer o risco de uma lei do género ser materialmente inconstitucional.

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